Sardinha em Lata



Sou a Sardinha em Lata, parente próxima em algum grau de assadura que me escapa agora, da Sardinha Assada, que é dona e rainha dos estômagos por altura dos Santos.
Perdi a cabeça (sou a peixa de Milu das conservas) e doei a cauda às sereias do Mar da Palha, feitas tágides e barbatanas aladas na voz. Podem ver-me exposta pela Conserveira de Lisboa, bem alinhadinha Tricana entre milhentas primas e enteadas. E entre goles e golos de cerveja, a piscar o olho desde os mostruários do Sol e Pesca ao Cais.

Mergulhada em piscina de azeite, banhada em molho de tomate, picante, alho e afins sabores familiares ao palato português, viajo em vagão metálico para o prato, onde então me concretizo em perfeita lua-de-mel com arroz e em união sobre o pão.
Desta camarata oleosa de gordura boa, partilhada entre tantas irmãs arrumadas em beliche, não fico atrás que outra qualquer prima distante, que morra de amores pelo assador. A ver bem, somos distintas, somos seleccionadas. E esboroamo-nos como ninguém sobre a tua língua, suavemente, a cada pequeno toque de dente.


LEEntrevista na LECool | edição 9 - 15 Julho

São os Santos. E há sardinha fresca, grelhada, gorda e saborosa.
E quando não são os Santos...há sardinha em lata, em conserva, gorda e saborosa. Em qualquer época ano e em qualquer situação.

A sardinha é o peixe mais abundante da costa portuguesa.
Continua a ser a espécie mais capturada (cerca de 70.000 toneladas por ano) pelo cerco (uma rede que cerca o cardume) de Norte a Sul do país.
As conservas foram em tempos uma indústria muito importante de Portugal.
Nos anos 60 havia cerca de 170 fábricas. Quase toda a produção era exportada, como ainda acontece nos dias de hoje. Mas nos anos 90 ficaram reduzidas a quase 50 fábricas.
As razões principais foram uma forte quebra em 1968 no stock de sardinha, a concorrência de conservas mais baratas provenientes de Marrocos e a restrições do mercado depois da entrada na CEE.

De qualquer forma as conservas de sardinha continuam!
Só não entendo porquê é que não são tão populares como o atum.
A conserva é a melhor método de conservar espécies pelágicas e gordas, como a sardinha e a cavala, que facilmente perdem a frescura. É uma forma de valorizar um recurso abundante e português e apanhado de uma forma relativamente selectiva. Além disso são um recurso com um ciclo de vida rápido e têm uma elevada renovação anual.

As conservas portuguesas continuam a ser apreciadas nos melhores mercados internacionais, como no Reino Unido e Itália. São reconhecidas pela sua elevada qualidade: o sabor do peixe e o facto de serem feitas com azeite, em vez de óleo, torna-as num dos produtos portugueses com maior valor.
É proteína animal, do mar, selvagem, de qualidade, e fácil de consumir...fast food!

Quando te lembrares do teu próximo pastel de bacalhau,
pensa nela,
e em vez dele,
abre uma lata e come uma sardinha!