Arquivo

A vida e a morte são dois conceitos muito próximos. É ténue a fronteira que os separa. Muito mais fina do que nós, comuns mortais deste planeta, damos conta.
Penso nisso cada vez mais devido ao meu percurso de vida, mas também devido às questões éticas do matar um animal para comer.
A curta metragem do S., Arquivo, retrata tudo isto. Durante alguns minutos aparece um peixe a morrer em cima de uma bancada. A agonizar com falta de ar. O efeito do som e da situação chocante foi que algumas pessoas saíram da sala de cinema enquanto o filme estava a ser exibido.
Era um peixe, como todos os outros peixes que comemos. No final do filme o realizador esclarece que para filmar aquela cena teve colaboração de biólogos marinhos e nenhum dos peixes utilizados foi morto durante as filmagens...apesar disso devem ter todos almoçado peixe grelhado no restaurante logo a seguir...
Onde ficamos? O que é que choca? Ver a realidade, que alguns dizem gratuita, esmiuçada num ecran ou esperar que alguém que não conhecemos que lide com ela?
O significado que damos à vida é relativo. É condicionado por muitos factores como a profissão, a educação, a experiência de vida e os ideais. Mas para mim a fronteira é tão ténue que não consigo imaginar uma sem a outra. Ou seja, para viver temos de matar. E o forma como vejo um peixe morto é diferente de outras pessoas.
No final do filme aparecem imagens da sala de anatomia da Faculdade de Medicina. São imagens de corpos conservados para estudo. O sítio é desagradável e a morte está presente mais uma vez. Neste caso somos nós o objecto de estudo. É a nossa morte que é mostrada, mas aqui como análise na medicina. É impressionante ver como os médicos ficam entusiasmados com a análise de uma doença mortal ou de células cancerígenas de um doente com cancro.
Tudo depende contexto e do ponto de vista de quem analisa.
Apesar das imagens, para mim o Arquivo, é um filme sobre a vida e não sobre a morte. Mostra os passos que envolvem o luta pela sobrevivência, a força que um peixe tem para não morrer, o tempo que demora sem nunca desistir. É com isso devemos a celebrar a vida.